Os trechos de DNA apelidados pelos cientistas de "genes saltadores" --
capazes de copiar a si próprios para outros pedaços do genoma de um
indivíduo -- estão relacionados a uma forma grave de autismo
hereditária.
A descoberta, descrita hoje pelo grupo do biólogo
brasileiro Alysson Muotri em estudo na revista "Nature", foi feita num
experimento que produziu neurônios dos portadores da doença a partir de
amostras de pele.
O trabalho é o segundo artigo de impacto assinado por Muotri, professor
da Universidade da Califórnia em San Diego, em menos de uma semana. Seis
dias atrás, o cientista divulgou estudo mostrando como os neurônios
"autistas" têm problemas para se interconectarem. Agora, ele relaciona o
autismo a uma instabilidade genética, pois os chamados retrotransposons
-- os "genes saltadores" -- podem bagunçar o DNA de uma célula e
alterar seu funcionamento.
Para reproduzir o neurônios autistas em culturas de células dentro de um
pires de laboratório, Muotri usou a mesma técnica nos dois trabalhos.
Seu grupo fez células de pele adultas reverterem a um estado primitivo,
similar ao de um tecido embrionário, e depois as estimulou a se
desenvolverem assumindo a forma de neurônios.
Essa ferramenta usada no experimento, as células iPS (células-tronco de
pluripotência induzida), revelou-se perfeita para estudar a doença, pois
não seria possível extrair amostras de células vivas do cérebro de uma
pessoa para entender seu desenvolvimento.
ntes do experimento com as células iPS, Muotri já tinha obtido
resultado similar usando camundongos transgênicos, portadores da mutação
no gene estudado. "Criamos um modelo de cérebro tridimensional e
descobrimos que as regiões do cérebro com maior número de neurônios
afetados eram regiões relacionadas com os fenótipos [traços físicos] da
síndrome de Rett", conta o cientista.
Muotri, porém, afirma que ainda é cedo para dizer o que é causa e o que é
consequência no estudo de pacientes de autismo. "A gente confirmou que
existem mais retrotransposons atuando no cérebro desses crianças, mas
nós não temos ainda como estabelecer causalidade", diz. "Pode ser que
eles não estejam causando o autismo. Pode ser que estejam contribuindo
para algumas formas de autismo, apenas."
Segundo o pesquisador, porém, a descoberta abre caminho para que se
teste estratégias diferentes de tratamento no futuro. Medicamentos
normalmente usados para atacar vírus (inibindo a cópia e multiplicação
de DNA) poderiam eventualmente deter a proliferação desenfreada dos
genes saltadores.
A ação dos retrotransposons no cérebro humano, contudo, pode não ser
totalmente maléfica. O efeito benéfico, especula Muotri, seria o de
conferir diversidade e complexidade aos neurônios, permitindo que a
mente humana se estruture de maneira tão sofisticada. Talvez por isso a
evolução os tenha preservado, apesar dos riscos.
Testo adaptado de:http://www1.folha.uol.com.br/ciencia
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